Tratado da irresponsabilidade

4 02 2010

Em causa não está a percentagem do défice que representa o aumento das verbas para a Madeira. Para o princípio que aqui vai ser exposto tanto faz ser o,o3% como 30%. É igual. O que está em causa é um princípio, um princípio de igualdade e de justiça. Já para não dizer um princípio de sanidade.

Portugal enfrenta uma situação difícil ao nível do controlo das finanças públicas. O défice já disparou, e sobre isso há pouco a fazer. É necessário tentar combater e reduzir a dívida. O Governo já se propôs a fazer isso, reduzindo o défice à volta de 1% este ano e trazendo-o para próximo dos 3% até 2013. A tarefa é difícil.

Por todo o lado, e erradamente, a situação portuguesa é comparada à grega. Mal feito, porque a realidade helénica é, em toda a linha, pior do que a nossa. No entanto, as agências de rating estão nervosas e o crédito ficou muito caro para Portugal. Ainda não atingiu máximos absolutos, mas há quase dois anos que não estava tão caro para o nosso país pedir dinheiro no estrangeiro.

A situação é tão complicada que o Governo, autocrático no passado, se propôs a negociar o Orçamento do Estado para este ano, assim como elaborar um Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC) para esta legislatura ainda “mais ambicioso” do que aquele apresentado pela Grécia e patrocinado pela Comissão Europeia. Negociações com o PSD e com o CDS estão marcadas para a defesa do PEC.

E, no meio de tudo isto, a Madeira vem pedir mais dinheiro. Independentemente da forma como olharmos para a questão, representa um acréscimo de despesa desnecessário. A Madeira não passa por dificuldades – pelo contrário, é a segunda região mais rica per capita do país. A Madeira tem uma dívida superior a mil milhões de euros quando há uns anos atrás, durante a gestão de António Guterres, o Governo da República assumiu a dívida madeirense, colocando assim o caderno do arquipélago a zeros.

A Madeira cobra uma taxa de IVA de 14% mas quer receber verbas do Estado como se cobrasse uma taxa de 20%. A Madeira, que já recebe todo o dinheiro de impostos cobrado na ilha, quer receber mais do bolo da República sem contribuir nada mais.

Como disse o ministro das Finanças, esta situação é uma afronta. Em primeiro lugar, porque num momento de dificuldade e que exige ainda mais rigor no controlo das contas públicas, a oposição em bloco (não interesse se sáo trotskistas, estalinistas ou betinhos de Cascais) quer aprovar um aumento de gastos desnecessário. Depois, a Madeira é a segunda região com maior poder de compra do país. Se os madeirenses receberem mais dinheiro, como justificar aos alentejanos, aos nortenhos ou aos trasmontanos que os que já são ricos vão receber ainda mais dinheiro?

Claro que nada justifica o teatro que o Governo tem feito em torno desta matéria. Mas, o tal princípio mantém-se: não estamos em altura para brincadeiras. É uma pena que os nossos deputados, irresponsáveis, não tenham noção disso mesmo e não consigam colocar os superiores interesses nacionais à frente das suas diferentes ambições político-partidárias. Uma tristeza e uma irresponsabilidade, a pedir a reforma do país.

Falta cumprir-se Portugal, dizia Pessoa. Não há ninguém interessado em fazê-lo?